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O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

" Que boa era a vida de Lisboa "

Cristina Ribeiro, 04.11.13
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" ( ... ) Esta deficiência é mais para lamentar, quando bem se conhece o amor da gente portuguesa às flores, de que estão patentes as provas nos telhados, saguões, varandas, janelas e muros dos velhos bairros da cidade, abrindo sorrisos nas faces tristes de Alfama e Mouraria. Por lá vicejam em testeiros, caixotes e panelas, os mangericos, os craveiros, as blandinas, as zínias e as sécias de preciosa lembrança.
É o delicado gosto, a comoção rural do nosso povo, a protestar suavemente contra panoramas de altos prédios, contra os emparedamentos humanos que furtam as graças e deleites da Natureza aos olhos que delas sempre ficaram saudosos; "
Hipólito Raposo, « Modos de Ver »

 

 

Quando, em 1979, fui viver para Carnide, sentia-se ainda um cheirinho dessa Lisboa. Os olhos deliciavam-se ainda com o pouco que de tal pintura campestre permanecera. Vida de bairro prazerosa, onde as compras eram feitas na pequena mercearia, depois de uma incursão na tradicional padaria, onde os mais idosos tinham encontro marcado para a conversa diária que os distraía do vazio que a aposentação sempre traz.
Nunca a tarde seria a mesma sem um passeio no belo jardim do coreto. Em havendo tempo, ali estava o banco de madeira à espera que nele me sentasse com um livro nas mãos. Não senti, pois, o choque de quem sai da aldeia para a cidade grande, demasiado grande, onde seria muito fácil perder-me no meio da multidão indiferente. Mas bastava dela me afastar para reconhecer já sinais de mudança: esse remanso não iria durar muito, convenci-me.

 

Anos depois tive a prova de que assim era, quando, de passagem, atravessei a outrora pacata estrada das Laranjeiras. Muito outra, e não gostei do que vi. Desisti logo de revisitar aquele que durante algum tempo tinha sido o meu bairro. Medo do que iria encontrar.

E se as eleições fossem amanhã?

Cristina Ribeiro, 12.11.10

 

 

 

 

 

 

Que faria uma pessoa -  neste caso eu - que acreditou que o dia 25 de Abril de há 36 anos nos iria levar a caminhos melhores do que aqueles por onde estávamos a seguir, e recordo que se é verdade que nos anos sessenta se vivia já bem  melhor do que,  soube-o depois, se tinha vivido nas décadas anteriores, continuava a viver-se por cá, não sei se por força de uma centralização castradora, situações de grande injustiça ( embora, e à custa de muito trabalho dos meus, e porque a vida nos deu oportunidades que nem todos tiveram, as não  tivesse sofrido na pele, testemunhei-as ), e chega ao fim destes anos todos e constata que nada tem a celebrar?

 

E assim conclui porque os partidos que nos governaram estes anos todos se equivalem na mediocridade?

Votar em branco chegaria para lhes levar o meu protesto, para os acusar de que me enganaram? Porque mesmo que reconheça numa pessoa ou noutra, potencialidades conclui que de nada isso valerá porque estão inseridas naquela bola de neve viciosa em que se tornou o promíscuo sistema partidário português?

É este o dilema em que me encontro, sem ver um pequeníssimo ponto de luz, que aponte o caminho.

Partidos que nos façam acreditar, mas pelas acções que desenvolvam em prol do bem de todos, e não se limitem a mais discursos empolados mas enganosos, porque desses estamos nós fartos.

 

E tudo piora quando outros partidos me não inspiram a mínima confiança.

Aonde nos touxeram!...

Cristina Ribeiro, 01.11.10

Num dia cheio de sol, vejo os campos muito verdes.

Aqueles que os patos bravos não conspurcaram ainda, e, tendo memória de como tudo isto era há trinta anos, é inevitável dizer- o que fizeram deste País, desde então ! -, acusação que reforço quando leio as notícias nos jornais on line.

Por essa altura - começos dos anos 70 - já se começava a ver melhorias, sustentadas, no panorama geral: todos os dias via filhos de lavradores passarem à minha porta,  a fim de apanhar a camioneta que os levaria a Guimarães, onde frequentavam o ensino secundário. Não se ouvia falar de corrupção entre os políticos...

Agora grassa por todo o país uma imoralidade gritante: os tais que " são mais iguais " do que os outros  a acumularem reformas sobre reformas milionárias, enquanto entre os " menos iguais " cresce, de dia para dia, a miséria.

Quando se começava a sair do " buraco ", e se vislumbrava já a liberdade, eis que voltámos para trás. Faltará muito para igualar o lamaçal da 1ª República?

O que fizeram deste 'País!

Atrás de mim virá quem igual fará.

Cristina Ribeiro, 01.11.10

Sendo uma grande verdade que  o Estado se transformou " numa máquina ao serviço do poder ", não é menos certo que essa transformação começou a dar os primeiros passos em épocas anteriores - assistimos, isso sim, à continuação desse trabalho transformador.

E  isso da " prepotência de uma maioria absoluta que não soube aproveitar as excelentes condições que teve para governar " soa-me a " déjà vu ".

O historial da prática governativa anterior, do mesmo modo, leva a ter um pé atrás.

Cada vez mais iguais.

Cristina Ribeiro, 26.04.10

Não há partidos impolutos neste país, respondi a um comentarista.

Quando entrou em Portugal este sistema partidário, o meu pai disse que iria votar no " mal menor "; na altura achei que estava a exagerar, e quando chegou a minha vez de votar, votei nesse mesmo partido - o CDS - com convicção.

O tempo encarregou-se de esfriar essa convicção, que passou a ter altos e baixos - queria que o partido se definisse, contra ventos e marés; contra a ideologia dominante.

Há dias disse que me orgulhava de nele ter votado, por ter ido contra este PEC, manifestamente mau, onde se mantém a veia megalómana do engenheiro, à custa de sacrifícios impostos aos contribuintes. Hoje digo que tenho vergonha de ter votado no partido que viabilizou aquela coisa a que o Presidente da A.R. chamou o problema 300 do país. Sabemos que são muitos, mas que tal começar por um deles, seja o 300 ou o 400?

Gosto de repetir a frase de Marguerite Yourcenar «O Tempo Esse Grande Escultor », mas, além disso, ele é um grande desmistificador.

Naquela altura as esperanças nos partidos

Cristina Ribeiro, 09.01.10

 estavam ainda intactas. É certo que para o meu pai o CDS nunca passou de " um mal menor ", mas os meus irmãos viam-no como algo de redentor, tal como aconteceria comigo mais tarde, até que fui confrontada com a evidência de que " são todos iguais ".

Naquele dia ( de 1975 ou 76? ) ia haver um comício no Teatro Jordão, em Guimarães. As ameaças a quem nele participasse sucediam-se. Foi pois com grande apreensão que a minha mãe, eu e as minhas irmãs, os vimos sair. Algum tempo depois tocou o telefone: era um amigo, que vivia na rua do Teatro, dizendo-nos que aquilo estava um pandemónio. Cheias de medo, ouvíamos os tiros, que se sucediam sem intervalo. Só descansámos quando os vimos- já muito pela madrugada dentro - entrar em casa, altura em que nos puseram a par das cenas Far-Westianas por que tinham passado. Deve datar dessa altura, embora de uma forma muito inconsciente, a convicção de que em Portugal se estava a brincar à democracia.

«Falta ao regime que nasceu com o 25 de Abril

Cristina Ribeiro, 24.10.09

o mínimo de credibilidade moral», escreveu o insuspeitíssimo António José Saraiva.

 

 

Há 33 anos, no dia correspondente ao de hoje, alguns homens devolveram-nos a esperança, ao livrarem-nos da maior e mais negra das ameaças, e como tal o festejamos, mas bem depressa o alento então insuflado se desvaneceria, até chegarmos ao estado amoral em que nos encontramos.

 

25 de Novembro de 2008

Tapar o sol com a peneira.

Cristina Ribeiro, 20.10.09

Como é que é possível pessoas, supostamente responsáveis, pensarem, sequer, que este modo de passagem administrativa ( e esta expressão traz más memórias, como por exemplo a do bendito Serviço Cívico, que fez um irmão mais velho escapulir-se para a Suíça ) vai ajudar um aluno que vive uma situação sócio-familiar grave? Tem todo o aspecto da tão portuguesa forma de " passar a batata quente ", sem perdas de tempo nem chatices. Mais uma acha para a fogueira que ameaça tornar-se um inferno: o Ensino em Portugal, que, enquanto alicerce de um edifício que é um país, ao deteriorar-se assim, ameaça tudo desmoronar.

 

 

Julho de 2009

" Em Guimarães, ao longo dos séculos, manteve-se a tradição de no dia 14 de Agosto

Cristina Ribeiro, 19.10.09

 

 se festejar com uma importante cerimónia religiosa a vitória na batalha de Aljubarrota. (...) eram expostas as peças oferecidas por D. João I: o loudel [ que usara na batalha ], a que o povo chamava pelote, e o presépio de prata dourada [ do espólio castelhano ]. 

No ano de 1638, um padre franciscano, Frei Luís da Natividade, foi porta voz do sentir de todo o povo português" (...) quando se dirigiu ao pelote nestes termos:"  - Pelote roto, pobre, esfarrapado e alanceado, hoje é mais próprio chorar mágoas presentes do que celebrar vitórias passadas"

Um pequeno excerto do livro «D. João I e Guimarães» . Referia-se o frade ao domínio filipino, mas se fosse a repetir agora o sermão, poderia utilizar as mesmas palavras.