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O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

« Também nesta casa a vida do escritor foi tudo menos fácil ».

Cristina Ribeiro, 04.12.10

 

Em «A Paixão de Camilo: Ana Plácido », Rocha Martins escreve que ' à porta de Camilo geraram-se sempre novelas: lá dentro do lar, passava-se o seu drama '  »

Leio, da Editora Opera Omnia, e de autoria de Secundino Cunha, « Casas de Escritores no Minho », e detenho-me nas fotografias daquela que melhor conheço -a de S. Miguel de Seide..

           Se na primeira visita me encontrava totalmente alheada  deste tão grande drama, quando pela segunda vez fui à casa que testemunhou os seus males, mas onde escreveu páginas e páginas que para sempre lhe valerão a imortalidade estava já bem ciente desse drama pessoal.

 

 

" Fez bem seu caloiro. Manuseie o bom Morais com mão diurna e nocturna.

Cristina Ribeiro, 21.04.10

 

 

Gaste assim as suas economias, não as malbarate em fofas novelas gafadas de galicismos ".

( Camilo, « Cancioneiro Alegre » )

 

Também nos livros temos os nossos pilares, a que nos seguramos quando surge a dúvida, a incerteza: determinadas enciclopédias, dicionários...; entre estes o último recurso, o tira-teimas é, para mim, o Dicionário de Morais.

Quando se me pôs a questão de, por razões práticas, ter de  " desterrar " alguns deles para outra casa, logo se tornou claro que destes cinco volumes ( é o Compacto ) não poderia nunca separar-me: sem eles, como ler alguns dos livros do homem de Ceide, ou outros de linguagem com a mesma, ou semelhante, vernaculidade?

Quando o busquei, há já uns quinze anos, tive de percorrer Ceca e Meca, e lamentei-me ao livreiro não encontrar os doze volumes que vira na estante paterna, mas quando ele me disse o custo dos cinco que levava, fiz como a raposa que disse imprestáveis as uvas que não estavam ao seu alcance " também não tinha espaço para tantos ".

Os dois Grandes vistos por Ramalho Ortigão

Cristina Ribeiro, 11.10.09

 

"Pelo conjunto das exuberâncias e das deficiências da sua natureza de escritor, pelas suas qualidades e pelos seus defeitos, pelo seu temperamento, pela sua educação, pela sua obra, que é a imagem da sua vida, o nome de Camilo Castelo Branco representará para sempre na história da literatura pátria o mais vivo, o mais característico, o mais glorioso documento da actividade artística peculiar da nossa raça, porque ele é, sem dúvida alguma, entre os escritores do nosso século, o mais genuinamente peninsular, o mais tipicamente português"

 

 

"Superiormente instruído, versado em todas as coisas do espírito, equilibrado por uma alta cultura, de que ainda ninguém deu fé porque ele se empenha em ocultá-la sob uma superficialidadede "clubman", por um profundo requinte de mundanismo e de bom-tom, Eça de Queiroz reúne todas as capacidades de inteligência ao incomparável poder de expressão literária e de análise psicológica, que fez dele no mundo um dos primeiros romancistas do século"

 

Camilo visto por

Cristina Ribeiro, 11.10.09

 

3. Fialho de Almeida

 

Ele mesmo um exímio escritor, tanto na faceta de ficcionista («Contos», «A Cidade do Vício»...), como nas de cronista e polemista mordaz, o que se espelharia na sua Obra mais conhecida, «Os Gatos», onde não poupa a sociedade do seu tempo, nem a "republiqueta"então emergente, na linha, aliás das «Farpas» de Ramalho Ortigão, este pessimista disse do homem de Seide : "A mais bela luz do génio de Camilo faísca na sua obra sarcástica. Nada pode dar ideia da veemência e pujança desta prosa de Vulcano, batida na forja dos coriscos e dos raios, onde co'as asperidões e rudezas da antiga linguagem se entrelaçam os nervosismos elásticos e as graças subtis do mais refinado poeta cortesão do penúltimo século. Eu não sei de ironia que tenha mais causticidade, nem de imaginação onde se insculpam mais finas rendas(...). Na caquexia das letras actuais, quando todas as energias parecem finar-se, e todas as originalidades irem adormecendo, a pletora deste homem faz medo, como em país de anões os 'grandia ossa' da fama primitiva."

 

 

Maio de 2008

Uma outra visão de Camilo

Cristina Ribeiro, 10.10.09

 

 

 

 

 

É de todos conhecido o mau feitio de Camilo, mas por muitos ignorada uma outra faceta do seu carácter, trazida até nós pelo camilianista, seu contemporâneo, António Cabral. Tinha este acto abonatório de uma índole generosa vindo a público nas páginas d'«O Primeiro de Janeiro» de 3 de Junho de 1890, pouco tempo, portanto, após a morte do escritor. "Foi há muitos anos, na Póvoa de Varzim. Camilo achava-se naquela praia, para onde fora com os filhos, que iam fazer uso dos banhos do mar. No mesmo hotel em que estava Camilo, achava-se um medíocre pintor espanhol, que perdera no jogo da roleta o dinheiro que levava. Havia três semanas que o pintor não pagava a conta do hotel, e a dona, uma talo Ernestina, ex-actriz, pouco satisfeita com o procedimento do hóspede, escolheu um dia a hora do jantar para o despedir, explicando ali, sem nenhum género de reservas, o motivo que a obrigava a proceder assim. Camilo ouviu o mandado de despejo, brutalmente dirigido ao pintor. Quando a inflexível hospedeira acabou de falar, levantou-se, no meio dos outros hóspedes, e disse: - a D. Ernestina é injusta. Eu trouxe do Porto cem mil réis que me mandaram entregar a esse senhor e ainda não o tinha feito por esquecimento. Desempenho-me agora da minha missão. E puxando por cem mil réis em notas entregou-as ao pintor. O Espanhol, surpreendido com aquela intervenção que estava longe de esperar, não achou uma palavra para responder. Duas lágrimas, porém, lhe deslizaram silenciosas pela faces, como única demonstração de reconhecimento".

 

 

Maio de 2008

Camilo visto por

Cristina Ribeiro, 10.10.09

 

 

2. Alexandre da Conceição

 

Este poeta e ensaísta foi uma das muitas pessoas com quem Camilo travou acesas polémicas, género em que era temido, dados o seu agudo sarcasmo e não menos violenta agressividade. Mas tal como aconteceu com outros alvos da sua verve polemista, também Alexandre da Conceição se tornou num grande admirador do autor de « A Queda de Um Anjo», como nos dá conta José Viale Moutinho, o qual coligiu vários textos de contemporâneos do escritor. "Camilo Castelo Branco é para nós um dos primeiros romancistas da Europa contemporânea. Não conhecemos em Nação nenhuma individualidade literária mais original, mais profundamente acentuada, escritor mais correcto, fantasia mais finamente engraçada, espírito mais vivo e sarcástico. (...) tem personagens cuja criação Balzac invejaria, Cherbuliez, Droz e Zola não seriam capazes de reproduzir mais vivos nem com mais relevo "

 

Maio de 2008

Camilo visto por

Cristina Ribeiro, 10.10.09

 

1. Ramalho Ortigão Nas últimas noites, antes de adormecer, tenho-me deliciado com a leitura de uns escritos de Ramalho sobre o homem de Seide: "Pelo conjunto total das exuberâncias e das deficiências da sua natureza de escritor, pelas suas qualidades e pelos seus defeitos, pelo seu temperamento, pela sua educação, pela sua obra, que é a imagem da sua vida, o nome de Camilo Castelo Branco representará para sempre na história da literatura pátria o mais vivo, o mais característico, o mais glorioso documento da actividade artística peculiar da nossa raça, porque ele é, sem dúvida alguma, entre todos os escritores do nosso século, o mais genuinamente peninsular, o mais tipicamente português."

 

 

Maio de 2008

Dom Pedro II do Brasil e Camilo Castelo Branco.

Cristina Ribeiro, 10.10.09

 

 

 

Comecei por socorrer-me do arquivo do Combustões, pois que tinha uma vaga ideia de um post em que versa esta matéria. Depois de uma busca, encontrei-o:" O Brasil de D. Pedro II e o Brasil de Lula", de 4 de Outubro de 2006; - aí diz o Miguel ser aquele "Homem de grande dimensão moral e intelectual(...)que sempre viveu de forma discreta" tendo sido grande amigo de Portugal e das letras portuguesas", referindo as visitas do Imperador a Camilo Castelo Branco. Mas os dois homens terão, além disso, mantido uma correspondência regular, como me dei conta ao consultar, entre outros, o «Boletim da Casa de Camilo. Tê-lo-á visitado, também, na casa do escritor no Porto, na Rua de S. Lázaro, em 1872, quando este já se encontrava doente: "Tornou-se assunto de conversação a analyse de uns quadros que o senhor Camillo Castello Branco tinha na sala, mostrando o soberano vastos conhecimentos sobre pintura". Depois de o escritor ter oferecido a D. Pedro um quadro com os vinte e um primeiros reis portugueses, tendo-se ele" comprazido de possuir umas lembrança de Camillo (...), fallaram de literatura, tanto portuguesa como brasileira, matéria sobre a qual o monarcha discursou largamente, com perfeito conhecimento de causa". Finalmente, num dos volumes de "Dispersos de Camilo" , coligidos por Júlio Dias da Costa, encontrei uma carta dirigida a Tomás Ribeiro, na qual diz Camilo: "No « Livro de Consolação», pagina primeira, está impresso um documento que eu desejo fazer-te conhecido. É uma carta escripta a S. Magestade o Imperador do Brasil, dedicando-lhe affoitamente e audaciosamente, o meu livro. Essa carta manifesta o meu grande respeito e a minha profunda gratidão áquelle magnanimo homem, que não carecia de diadema para ser um dos mais veneraveis cultores das letras, e amigo dos operarios que vivem acorrentados á galé dos trabalhos do espírito, em que a alma, alando-se para altas regiões, vai deixando cahir em terra o corpo despedaçado».

Duas visitas à casa de S. Miguel de Seide ( 2 )

Cristina Ribeiro, 09.10.09

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 "Aqui está o seu Bernardino Ribeiro, o seu Bernardes, o seu António Ferreira... É verdade- respondeu o conde-Todos amigos velhos e d'aquelles de quem se não receberam nem esperam senão bellos officios".

                  «Herança de Lágrimas», de Ana Plácido.

 

Voltei há alguns meses a casa de Camilo, mas agora marcara encontro com Ana Plácido. Tinha adquirido, havia pouco tempo, os dois romances que publicara com o seu nome- por vezes terá recorrido a pseudónimos-, este e «Luz Coada por Ferros»- e fiquei curiosa por saber mais. Foi assim que fiquei a saber, primeiro pela guia, depois procurando noutros lugares, tratar-se de uma senhora de razoável cultura literária, cimentada no conhecimento efectivo de autores clássicos, mas também românticos, que traduziu vários romances franceses, e manteve colaboração regular em vários jornais e revistas. Terá, ainda, sido o braço direito de Camilo, ao prestar-lhe vários serviços na feitura dos seus livros, como a revisão dos textos. Isto para além de lhe ter emprestado os olhos, quando os do escritor começaram a ceder.

 

 

Abril de 2008

Duas visitas à casa de S. Miguel de Seide

Cristina Ribeiro, 09.10.09

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"A respeito do último discurso de Calisto Elói, as gazetas governamentais estamparam que a sala da representação nacional nunca tinha sido testemunha de insolências de tamanha rudeza e tão audaciosa ignorância" («A Queda dum Anjo», de Camilo Castelo Branco).

 

Era muito pequena ainda quando meu pai me levou a casa de Camilo. Dessa visita guardo uma memória muito esbatida, tendo-me ficado na retina aquela cadeira de baloiço, muito provavelmente porque fiquei impressionada quando o guia disse que terá sido aí que o escritor se suicidou. Cresci ouvindo falar nele com uma grande admiração: o seu busto estava num lugar de destaque, na estante que continha a camiliana. Quando, timidamente, e com relativa desconfiança sobre o acerto de tal veneração, me aventurei na sua obra- creio que o primeiro livro que li foi «A Brasileira de Prazins», o qual só mais tarde abarquei no seu justo valor-, confesso que não fiquei logo cativada. Foi fora do tempo. O encantamento viria mais tarde, com «A Queda dum Anjo», seguido de »Eusébio Macário» e «A Corja»: a escrita escorreita, a riqueza do vocabulário e a fina ironia, iriam fazer com que , de quando em quando, volte a eles, nem que seja para ler um trecho ou outro...

 

 

Abril de 2008