Era uma casa grande, de granito, com portas e janelas verdes,
e com muitos quartos, porque era grande a prole. Descendia de uma família de moleiros e padeiros, e quando casou com o avô, carpinteiro que trabalhava então no Teatro Circo de Braga, começaram a construi-la, e aí montaram uma padaria, onde a avó iria dar continuidade ao negócio familiar. Alguns anos passados, e já com três filhos, o avô rumou ao Brasil, onde trabalhou numa fábrica de tabaco na Baía. Enquanto isso a avó, uma mulher cheia de garra, criou uma mercearia, onde, além do pão de trigo e das broas que cozia, vendia azeite, café e bacalhau. Era a Venda da avó, onde eu comi as primeiras bolachas Maria... Na altura da II Guerra, quando os alimentos eram racionados, o meu avô, que entretanto regressara, e era " um Homem bom" nunca deixou que nenhum vizinho passasse fome, mesmo quando não tinha com que pagar: como dizia a avó, " tinha os seus protegidos". A minha mãe e tios dizem o melhor possível desse avô, de quem não guardo lembrança, pois que morreu cedo. A avó viveu ainda por muitos anos, sempre a trabalhar na Venda. Nos seus últimos tempos, já eram os próprios clientes que se serviam: "Srª Aninhas vou levar um litro de azeite; assento no livro e pago no próximo mês". Sentada num banco a avó acenava com a cabeça: "Está bem". Quando, há tempos, fui em busca da minha Escola Primária, para a fotografar, passei pelo lugar onde estava a casa, mas agora estava lá outra, bem diferente; e pensei "ainda bem que o nosso amigo pintor a fixou naquela aguarela".
Novembro de 2008