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O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

O Tempo Esse Grande Escultor

Um arquivo dos postais que vou deixando no Estado Sentido, mas também um sítio onde escrever outras coisas minhas..Sem Sitemeter, porque pretende ser apenas um Diário, um registo de pequenas memórias...

Na véspera do aniversário de Camilo,

Cristina Ribeiro, 21.03.10

 

releio bocados de « Estrelas Propícias », Romance quase integralmente passado nesta nossa Região mais a Norte - o Porto é um protagonista sempre presente-, num cenário mais bucólico do que nunca, com ponto de partida nas margens desse " rio das saudades e dos pavores da mitologia ", e digo como o meu outro autor de cabeceira " morro de amor pelo meu pátrio Minho ", mas sem poder impedir-me de ter saudades desse Minho que foi o deles.

Desta casa saía, muitas vezes,

Cristina Ribeiro, 18.03.10

 

 

madrugada ainda, alumiado o caminho pela candeia a petróleo, a tia avó Maria a caminho da igreja, longe que ela ficava. A essa hora, já a irmã, minha avó, havia muito tratava de cozer o pão, a tempo de quem ia trabalhar o ter já pronto para, lá na Venda, acompanhar a aguardente mata-bicho com que cada um começava o dia. De cada vez a tia Maria batia na janela da casa do forno, a dar os Bons Dias, e quando a irmã dizia ser ela tola, que àquela hora deveria estar em casa, que deveria estar a fazer companhia à mãe , respondia: vou rezar por vós, já que não podeis ir.

Quando se sentia assim, com mal d'alma,

Cristina Ribeiro, 17.03.10

 

era para lá que fugia, numa tentativa de se desprender dos ruídos que sempre a ensurdeciam. Um pequeno ribeiro atravessava os campos, e era junto dele, onde a água corria dolente mas devagar, que procurava a paz perdida. E o pequeno rafeiro, que encontrara havia algum tempo naquele mesmo local, coberto de chagas, e parecia entender que agora era a vez de lhe lamber as feridas,seguia-a, pronto a dar-lhe o " amor desinteressado " de que falam os poetas. As andorinhas, que entretanto se lhes tinham juntado, como que traziam histórias para a distrair, e o certo é que acabavam todos quase em doce cavaqueira. Escurecia já quando se dispôs a voltar, e se era verdade que o coração lhe doía ainda, também era certo que reencontrara alguma daquela paz

« Memórias de um Burro »

Cristina Ribeiro, 16.03.10

 

É a capa de uma edição anterior, mas foi este o primeiro livro que li da Condessa de Ségur, deu-mo o meu pai numa das primeiras visitas à Feira do Livro do Porto, numa altura em que à minha irmã coube « Os Desastres de Sofia»;

lembro que não gostei mesmo nada da distribuição de títulos, mas lembro também que , quando li o livro, achei que tinha tido muita sorte. Entretanto o livro desapareceu, e hoje tenho uma pena enorme. Coisas do passado que ainda hoje me comovem, e que me fazem pensar que tenho a grande sorte de guardar muito da criança que fui...

Outro dos amores da minha infância:

Cristina Ribeiro, 13.03.10

 

 

 

aquele livro em que Edmundo de Amicis dá voz ao pequeno Henrique, quando este se decide a escrever um Diário, desde a sua entrada na escola.

« Coração » foi um livro que me acompanhou desde os oito anos, e que continua dentro dele.

Porque como diz uma citação de autor desconhecido, referida por Tomaz de Figueiredo, « On ne guérit jamais de son enfance ».

Foi num 31 de Março, não sei já de que ano

Cristina Ribeiro, 13.03.10

 

que o cimo da escrivaninha do meu irmão, que celebra nesse dia o aniversário natalício, se encheu com os livros de Eça de Queiroz editados pela « Livros do Brasil » . Foi uma surpresa não só para ele, mas para os outros irmãos, que já afilavam o dente ao ver aquela colecção inteirinha à nossa espera.

        Mas esperava-me um balde de água fria; Só podes entender estes livros quando tiveres 15 anos, disse o meu pai, quando viu o olhar guloso que lhes deitei.

Deve ter sido por essa altura que comecei a visitar regularmente a escrivaninha do meu irmão.

Não sei a quando remonta a rivalidade entre Braga e Guimarães,

Cristina Ribeiro, 13.03.10

 

João Franco Castelo Branco, em 1886. ( Memórias de Araduca )

 

 

                nem sei qual a sua origem, mas lembro-me de ter lido n« O Minho Pitoresco » uma referência a um pleito judicial ; no Século XIX, sobre demarcações geográficas, que resultou na atribuição de grande extensão do monte da Falperra ao concelho de D. Afonso Henriques, coisa com que ainda hoje a cidade dos arcebispos não se conforma. Quer de um lado quer do outro, gente há que leva esta " má vizinhança " a peito, de tal modo que a sua maior alegria é a de saber da derrota do clube de futebol rival.

 

Pouco depois de ser eleito pelo círculo de Guimarães, em 1884, ficaram célebres os discursos proferidos por João Franco, versando este conflito, em defesa das gentes que o elegeram.

Se Goethe chamou Varanda da Europa

Cristina Ribeiro, 09.03.10

 

à cidade que se debruça sobre o Rio Elba, Jaime Nogueira Pinto chama a Lourenço Marques a Varanda do Índico; de todo um Oceano desbravado pelos valentes marinheiros que partiam do Tejo sem saber mínimamente aonde iriam aportar, ou, sequer, se a braveza do mar os deixaria arribar aonde quer que fosse. E eu que nunca fui a África, e só a conheço de relatos como este, sou levada a pensar que sim, que a cidade é mesmo essa varanda, construída pela Natureza, mas onde é inegável a mão portuguesa, aonde podemos e devemos sempre voltar, depois de uns devaneios que nos desviaram da rota certa.

A " minha " Lisboa de meados dos anos sessenta ( 2 )

Cristina Ribeiro, 07.03.10

 

" ... de que recordo apenas ser muito íngreme ", dizia ontem  da rua onde passei algum tempo da mais tenra meninice. Hoje, depois de ter falado com o filho da D. Augusta, que casou cá no Norte, e vive em Braga, sei já que era a Rua Capitão Renato Baptista.

Mas se da Rua não tenho uma lembrança muito nítida, a não ser a de uma mercearia, onde a D. Augusta me levava muitas vezes, e aí recordo o orgulho, quase maternal, com que me mostrava, perguntando se não estava desenvolvida para a idade que tinha, o mesmo não acontece com a casa: nas traseiras, um pequeno pátio com uma pequena capoeira, onde o único habitante, hóspede de luxo, era um galo - o coquinhas - que só pernoitava lá: todo o resto do tempo andava livre pela casa, onde era rei e senhor; quando estávamos à mesa empoleirava-se no ombro de um dos três elementos da família, com um à-vontade de quem sabe que é bem vindo.

Três cágados passeavam-se pachorramente pela casa.

A senhora gostava muito de animais e era incapaz de os matar: uma vez,, o meu pai presenteou-os com um cabrito pequeno, que por lá ficou, até atingir a idade adulta, altura em que o enviaram para a aldeia do senhor Moreira, nas faldas da Serra da Estrela.

A " minha " Lisboa de meados dos anos sessenta ( 1 )

Cristina Ribeiro, 06.03.10

 

 

E as memórias vieram de novo ter comigo, quando li este post.

 

Quando jogava o Monopólio, a Rua Augusta tinha para mim um duplo valor: o que lhe era reconhecido pelo  jogo, mas também porque a considerava a " minha " Rua:

Quando andou por Lisboa, na tropa, o meu pai tratou de espreitar  as oportunidades para o negócio que tinha em mente; foi assim que conheceu a casa que, durante muitos anos, antes de começar a exportar, foi o seu melhor cliente: o Braz & Braz.

Acabada a tropa, e iniciado o negócio sonhado, começou a visitar aquela grande Casa de Comércio,muito perto da praça da Figueira, aonde fui muitas vezes, muito pequena ainda.

Desde o primeiro momento fez grande amizade com um funcionário, o Sr. Moreira, passando a ser visita assídua da sua casa, enquanto ele, a esposa e o filho vinham passar as férias ao Norte.

Chamava-se a senhora Domina Augusta, e quando nasci estava assente que seria a minha madrinha, mas dois dias antes do baptismo foi vítima de um acidente cardio-vascular que a deixou incapacitada por muito tempo. Herdei-lhe, porém, o segundo nome, e, até ela morrer, considerei-a " a " minha madrinha.

Pequena, e a senhora já recuperada, muitas foram as temporadas que passei na casa de uma rua de Lisboa, de que recordo apenas ser muito íngreme.

E muitas vezes ela me dizia: - hoje vamos até à " nossa" Rua...

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