A Tormes de Eça e de Jacinto.
Há uns anos estive na Quinta de Vila-Nova, em Stª Cruz do Douro, na casa que pertencera a Emília de Castro, mulher de Eça de Queirós, depois de a receber em herança de sua mãe, a Condessa de Resende, já então transformada num museu dedicado ao escritor: a Fundação Eça de Queiroz. Seria este lugar imortalizado no romance «A Cidade e as Serras», como a Quinta de Tormes, aonde Jacinto "regressa", depois de sempre ter vivido no nº 202 dos Campos Elísios, em Paris, a fim de assistir à trasladação dos ossos dos antepassados para a Capela de Família. Uma vez chegado à estação de caminho de ferro que servia o local, o dono da Quinta teve de subir a serra numa égua, seguido pelo amigo José Fernandes, montado num jumento, por um caminho "íngreme e alpestre"; mas em breve os seus males "esqueceram ante a incomparável beleza daquela serra bendita", onde "para os vales, poderosamente cavados, desciam bandos de arvoredos, tão copados e redondos, de um verde tão moço"; "Jacinto, adiante, na sua égua ruça, murmurava: - Que beleza!" e José Fernandes, " atrás, no burro de Sancho, murmurava: - que beleza!". De tal forma que o "Príncipe da Civilização" irá trocar definitivamente a Cidade Cosmopolita pelo "Castelo da Grã-Ventura", que é afinal a Serra do Douro, depois de uma primeira impressão negativa, quando encontrou um casarão "inabitável", o que faz com que logo manifeste vontade de partir para Lisboa no primeiro comboio. É esta mesma impressão que Eça faz chegar a sua mulher, numa carta endereçada da Quinta de Vila Nova, aquando de uma segunda visita, em 1898, após lá ter ido com a cunhada Benedita, seis anos antes, e ter afirmado o quão maravilhoso era o caminho percorrido a cavalo: achava agora a serra " um pouco banal e mesquinha", mas tratava-se, também aqui, de "impressão pouco duradoura", tendo bastado dois ou três passeios para o fazer experimentar"l'ancien charme".
Maio de 2008